uma dor nas costas e um aperto no coração e toda uma existência dissolve-se num sopro.
somos tão efémeros e nem por isso nos apercebemos da nossa fragilidade. nunca esperamos o que nos espera. felizmente a vida é uma surpresa. felizmente mesmo em alturas mais tristes e trágicas. impede-nos alguns sofrimentos.
hoje consigo escrever sobre aquele dia. nunca eu tinha passado por uma situação de perda existencial tão forte, intensa e presencial. o vácuo de uma existência na minha vida. um peso tão grande que o vazio carrega. que dor não dorida que atravessa o coração e ecoa por todos os poros. a respiração tem de ser forçada. os nervos contraem, os músculos colapsam e todo o meu corpo chora.
um momento de pânico e encontro-me cara a cara com a morte de alguém que me é tão mas tão querido.
ainda hoje sinto o peso do seu corpo nos meus braços e aperto-a forte no meu peito para que não se esfume nunca da minha memória como se o meu abraço fosse um cofre para a sua alma. fixo-a enquanto respira uma ultima vez. os músculos colapsam. os meus olhos afogam-se à medida que se afasta para sempre. o pânico e a sobriedade. acordo para um grito de socorro. o mundo que pare, por favor, enquanto a minha avó não estiver de pé de novo nada mais importa. por favor acorda, avózinha. a rápida intervenção de 3 voluntários que me libertam do seu corpo e se abeiram para lhe dar 2 sopros de esperança. ou a mim, talvez. um médico, seu colega, que a reconhece enquanto tenta a reanimação. a espera interminável pela ambulância. o telefonema para a mãe. o desespero. o pânico.
a minha avó é hoje, a brisa da manhã e a estrela da noite. tenho-a mais presente agora do que teria qualquer outro dia em que ela respirasse. mas este vazio que a sua ausência ocupa é dilacerante.
é a sua alegria e boa disposição que quero deixar como legado ao mundo. porque ela era parte do meu mundo que se partiu aos bocadinhos numa quarta-feira de ida ao supermercado.
hoje estou bem. amanhã talvez não. dizem que vai custar muito, daqui a uns tempos. preferia não estar sozinha, quando a saudade batesse mas o "nosso" prédio é testemunha da sua ausência.
hoje quero recordá-la com a tranquilidade que me permite o seu adeus tão atabalhoado numa quarta feira de ida ao supermercado.
amo-te incondicionavelmente, avózinha!
Júlia Marques | 1928-2016
somos tão efémeros e nem por isso nos apercebemos da nossa fragilidade. nunca esperamos o que nos espera. felizmente a vida é uma surpresa. felizmente mesmo em alturas mais tristes e trágicas. impede-nos alguns sofrimentos.
hoje consigo escrever sobre aquele dia. nunca eu tinha passado por uma situação de perda existencial tão forte, intensa e presencial. o vácuo de uma existência na minha vida. um peso tão grande que o vazio carrega. que dor não dorida que atravessa o coração e ecoa por todos os poros. a respiração tem de ser forçada. os nervos contraem, os músculos colapsam e todo o meu corpo chora.
um momento de pânico e encontro-me cara a cara com a morte de alguém que me é tão mas tão querido.
ainda hoje sinto o peso do seu corpo nos meus braços e aperto-a forte no meu peito para que não se esfume nunca da minha memória como se o meu abraço fosse um cofre para a sua alma. fixo-a enquanto respira uma ultima vez. os músculos colapsam. os meus olhos afogam-se à medida que se afasta para sempre. o pânico e a sobriedade. acordo para um grito de socorro. o mundo que pare, por favor, enquanto a minha avó não estiver de pé de novo nada mais importa. por favor acorda, avózinha. a rápida intervenção de 3 voluntários que me libertam do seu corpo e se abeiram para lhe dar 2 sopros de esperança. ou a mim, talvez. um médico, seu colega, que a reconhece enquanto tenta a reanimação. a espera interminável pela ambulância. o telefonema para a mãe. o desespero. o pânico.
a minha avó é hoje, a brisa da manhã e a estrela da noite. tenho-a mais presente agora do que teria qualquer outro dia em que ela respirasse. mas este vazio que a sua ausência ocupa é dilacerante.
é a sua alegria e boa disposição que quero deixar como legado ao mundo. porque ela era parte do meu mundo que se partiu aos bocadinhos numa quarta-feira de ida ao supermercado.
hoje estou bem. amanhã talvez não. dizem que vai custar muito, daqui a uns tempos. preferia não estar sozinha, quando a saudade batesse mas o "nosso" prédio é testemunha da sua ausência.
hoje quero recordá-la com a tranquilidade que me permite o seu adeus tão atabalhoado numa quarta feira de ida ao supermercado.
amo-te incondicionavelmente, avózinha!
Júlia Marques | 1928-2016

Comentários
Não sou a tua avó e nunca vou conseguir fazer desaparecer essa imensa dor que é perder alguém que amamos muito, mas sou uma amiga que pode dar um abraço e um carinho para apaziguar essa dor e farei-o com todo o carinho e amizade!
Força minha querida e se é possível esse o legado que a tua avó te deixou, então encara a viva com o sorriso, alegria e boa disposição com que ela o fazia... É a melhor homenagem que lhe podes prestar :)
eu conto sempre contigo, porque sei que o posso fazer! És o melhor que uma amiga precisa ser!
Há dias (e noites, como a anterior) que pesa mais o vazio que todo o conjunto de tudo o que se possa pesar! Obrigada por tudo o que tens sido para mim.
Mil beijinhos. Até "logo"! ;) ;)